sábado, 13 de novembro de 2010

EUA X CHINA: AINDA LONGE DE UM ACORDO


O crescimento das exportações chinesas prossegue em marcha acelerada. Depois de uma breve quebra de ritmo durante o auge da crise financeira deflagrada em set 2008, as taxas já estão de volta a um nível de expansão superior a 25% ao ano.

O quadro abaixo, que faz uma comparação direta do comércio entre os EUA, a China e o Resto do Mundo, é testemunho contundente do vigor comercial dos asiáticos, servindo como bom ponto de partida para qualquer análise que pretenda examinar os resultados da estratégia cambial daquele país.

COMÉRCIO DOS EUA COM A CHINA E O RESTO DO MUNDO (US$ BILHÕES)

COMPRAS DOS EUA DE


VENDAS DOS EUA PARA

A

B

B/A

C

D

D/C

RESTO DO MUNDO

CHINA

%

RESTO DO MUNDO

CHINA

%

I

2008

2103,64

337,77

16,06

1287,44

68,7

5,34

II

2009

1559,62

296,37

19,00

1056,04

69,5

6,58

II/I

%

-25,86

-12,26

-17,97

1,16

III

2009 ATÉ AGO

982,16

184,91

18,83

670,60

41,1

6,13

IV

2010 ATÉ AGO

1240,08

229,21

18,48

862,75

55,8

6,47

IV/III

%

26,26

23,96

28,65

35,77

Fonte: Departamento de Comércio-EUA

Até o ano de 2008 a China era responsável por 16% de tudo que a economia norte-americana comprava do Resto do Mundo. Com o advento da crise, essa participação aumentou abruptamente para 19,0% em 2009, estabilizando-se em torno dos 18,5% neste ano de 2010. O descontentamento dos norte-americanos com essa situação continua grande, pois, apesar do crescimento das importações chinesas de produtos oriundos dos EUA, o déficit comercial com aquele país deve ser em 2010 bem próximo aos US$ 269 bilhões registrados em 2008, antes da crise.

As perspectivas de reverter esse quadro são pequenas. Já vai longe o ano de 1944 quando os EUA, vencedores da segunda guerra mundial, conseguiram impor em Bretton Woods um padrão ouro baseado no Dólar, colocando de lado a proposta do Bancor encaminhada pela delegação inglesa através de Lord Keynes, o maior economista de todos os tempos.

A política cambial posta em prática pelos chineses, de manter uma paridade fixa com o Dólar, equivale, na prática, a uma guerra cambial. Isto porque, ao manter sua moeda em uma paridade permanentemente fixa em relação ao Dólar, aquele país cria um diferencial sistemático de preços que atraem compradores de todo o planeta. Isto se acentuou especialmente depois que a queda do Dolar entrou em uma espiral descendente ainda longe de terminar.

O crescimento extrovertido dos chineses transformou em suas presas preferidas todos os mercados do planeta mas, em especial, aqueles tradicionalmente ocupados pelos EUA.

Como a Europa e os EUA continuam no meio de uma grande crise de confiança, a recessão tem-se revelado mais duradoura do que se pensava inicialmente. É dentro desse quadro que devemos ver a recente movimentação de Ben Bernanke, presidente do Banco Central norte-americano-FED, que acabou de anunciar uma expansão adicional de liquidez espantosa, um verdadeiro Tsunami monetário.


A monetização que se seguiu à formidável destruição de ativos financeiros provocada pela crise financeira de 2008, foi digna de nota, mas revelou-se incapaz de ajudar os EUA a suplantar a crise de confiança que se instalava no país.


Ao induzir o FED a elevar a base monetária de um patamar de US$ 800 bilhões para US$ 2000 bilhões , o novo governo Obama esperava tirar a economia da estagnação.Não conseguiu,pois a acachapante derrota eleitoral sofrida pelo seu partido apenas confirmou como o desemprego ainda está elevado naquele país.

Com a taxa de desemprego ainda alta, e,além disso, como no front externo, a China não dá o menor sinal de que vai flexibilizar sua política cambial, os EUA sentem-se desconfortáveis e emparedados.

A opção por aumentar ainda mais a criação de dólares, ou seja, expandir em mais 30%, durante o período de seis meses o papel moeda em circulação, pode ser avaliada como irresponsável por pelos menos dois aspectos:

a) submeter toda comunidade de países a uma pressão adicional de ingresso de capitais especulativos, especialmente para aqueles onde as taxas de juros são bem mais altas do que nos EUA, como é o caso do Brasil e da maior parte dos países emergentes;

b) submeter sua própria moeda, ultima das moedas plenamente conversíveis do planeta, a um teste de stress dessa magnitude é uma temeridade e de alto risco.

Através da recompra de títulos de longo prazo do Tesouro, a intenção subjacente do FED é aproximar as taxas longas dos 0,25% a.a., hoje em vigor para os FED FUNDS, tornando ainda mais achatada(flat) a estrutura a termo de taxa de juros no país, facilitando a criação de mais crédito e liquidez para os prazos mais longos.

A dificuldades trazidas pelo impasse cambial, associadas ao baixo nível de atividade dos países desenvolvidos, nos empurram, assim, para um multilateralismo crescente.

A cada dia que passa fica cada vez mais evidente que os EUA e os países desenvolvidos terão que dividir o poder de que desfrutam nos principais órgãos internacionais: ONU, FMI. BIRD, OMC, etc, com a China, Brasil e demais países emergentes.

Até aqui a técnica de protelação mais utilizada é a do contingenciamento na base do conta-gotas. Algo muito parecido ao que fazem os Chineses com suas desvalorizações cambiais.

Tudo isto nos levou ao atual impasse, e indica estar cada vez mais próxima uma nova rodada institucional de reordenamento internacional.

As discussões do G-20 em Seul, neste final de 2010 já podem trazer algumas novidades nessa direção.

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Niterói, Rio de Janeiro, Brazil
Macroeconomista, Consultor e Professor da Fundação Getúlio Vargas - FGV e da FK Partners. Autor do livro Saia do Vermelho - Editora Qualitymark

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