segunda-feira, 9 de agosto de 2010

A Política de Reservas Internacionais: Cobertura de Riscos X Desordem Macroeconômica.


Os recursos utilizados pelo Banco Central do Brasil para adquirir dólares ou moedas estrangeiras de alguma conversibilidade internacional, que desejam ingressar no país, são realizadas com novas emissões de sua moeda, ou seja, Reais.

Esse fenômeno é generalizado em quase todos os países do planeta, com exceção daqueles detentores de moedas plenamente conversíveis, como a Libra inglesa no século XIX ou o Dólar norte-americano no século XX e ainda hoje. Como principal moeda de referência das transações comerciais, essa moeda ostenta ainda grande aceitação na liquidação das operações, embora esteja vivendo o pior momento como reserva de valor de sua história.

A possibilidade de circular livremente dentro e fora do país emissor, dá a esses países um privilégio ímpar, que se traduz principalmente em maiores graus de liberdade, opções e escolhas de Política Econômica.

Nesse caso, o dispositivo do curso forçado da moeda perde efetividade obviamente, pois o ajuste do balanço de pagamentos do país de moeda conversível fica automático, não dependendo da existência de poupança doméstica para que as autoridades monetárias realizassem a conversão entre moedas, trocando moeda estrangeira por moeda local.

Preocupados com as dificuldades de origem fiscal enfrentadas pelos PIGS na região do Euro, os norte-americanos devem manter suas taxas de juros próximas a zero por mais tempo , pois temem uma recessão mais duradoura do que esperavam até aqui.

Essa sobrevida maior das baixas taxas de juros nos países desenvolvidos tende a carrear durante um período adicional mais recursos para os países emergentes, pois é, afinal, onde o crescimento econômico ocorre hoje no planeta e as possibilidades de remuneração dos capitais são maiores e melhores.

A armadilha da liquidez de que tanto reclamam os norte-americanos, através do presidente do FED, Ben Bernanke, mostra que a crise de confiança que se generalizou naquele país ainda está presente e dá sinais de resistência. Além disso, é quase impossível imaginar que a população volte a consumir bem acima do que o país produzia, voltando aos padrões pré-crise.

O aumento da aversão a risco também está presente entre os emergentes. Um possante indicador disto é a elevação do nível de estoque de reservas internacionais demandado por esses países.


O paradoxo é apenas aparente: um pequeno grupo de países dominado pelos emergentes é hoje o grande financiador dos erros de gestão dos países desenvolvidos. Os BRICS mais Japão e Coréia do Sul são detentores quase absolutos das reservas que financiam os EUA e demais países centrais.

Dentro desse quadro, o Brasil, que declara praticar um regime de câmbio flexível, tem recebido importante volume de capitais privados em moeda estrangeira oriundo, principalmente, dos investimentos diretos e de portfólio dos países desenvolvidos.

Apesar do propalado regime de câmbio flexível , as atuações do Banco Central do Brasil no que se refere ao setor externo tem sido a de comprador líquido contumaz, ficando clara a sua intenção de não deixar a taxa de câmbio chegar abaixo de R$ 1,70/US$.

Os números presentes nos Fatores Condicionantes da Base Monetária divulgados mensalmente pelo Banco Central mostram que durante 18 meses sem interrupção, desde fev/2010 até julho/2010 foi sempre comprador líquido de câmbio. Oscilando desde um mínimo de R$ 0,75 bilhões em fev/2010 a um máximo de R$ R$ 11,89 bilhões em out/2009, apresentou uma média mensal de R$ 5,28 bilhões adquiridos no período.

PRINCIPAL PROBLEMA MACROECONÔMICO:
- Para esterilizar a continuada aquisição de câmbio que levou aos atuais US$ 255 bilhões de Reservas Internacionais, sem provocar uma depressão súbita na taxa de juros Selic da Política Monetária, capaz de manter a inflação próxima à meta fixada pelo CMN (4,50% em 2010 e 2011), o Banco Central precisa oferecer títulos públicos federais em quantidade apropriada e substituir a indesejável expansão monetária inicial. No momento atual isto está cada vez mais difícil de realizar pois faltam títulos públicos de emissão do Tesouro.

RESULTADO:
Existe hoje um volume de operações compromissadas overnight, sem lastro, operadas pelo Banco Central próxima a R$ 350,7 bilhões (31/7/2010).

Com o Banco Central claramente Undersold (faltam títulos para lastrear o que a autoridade monetária tomou do mercado por um dia) é grande a pressão para que o governo peça autorização ao Senado da República para emitir os faltantes R$ 350,7 bilhões.

A iniciativa de criar um Fundo Soberano que permitisse mais liberdade na gestão cambial, de modo a contornar os problemas conhecidos na Literatura econômica como “Dutch disease”, continuam fora de combate, por falta de vontade política para encarar o desafio de elevar a poupança doméstica.

POSSIBILIDADES:
Isto provavelmente não será feito de imediato porque , além do desgaste político associado à uma abrupta elevação da Dívida Pública Bruta, tal decisão significaria atribuir um caráter permanente a um estoque de Reservas Internacionais, aumentado pela aversão a risco pós-crise, e que, afinal, pode ser apenas transitória.

Mario Juan Leal

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Macroeconomista, Consultor e Professor da Fundação Getúlio Vargas - FGV e da FK Partners. Autor do livro Saia do Vermelho - Editora Qualitymark

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