segunda-feira, 5 de setembro de 2011

A Distribuição de Renda depois da Estabilidade

Contornar os controles orçamentários e os mecanismos de responsabilidade fiscal através de orçamentos paralelos acabou por retirar oportunidades de maior crescimento da renda e do emprego. Em boa medida, mostra a evidência empírica, isto decorre da utilização de uma taxa de juros maior do que a adequada.


Não há ilusões, a economia acaba descobrindo se os governos estão driblando a restrição fiscal. A inflação está aí para isso...

Embora a argumentação de que um aumento do volume de financiamento aos investimentos através dos bancos oficiais (BNDES/TJLP) represente um maior estímulo ao surgimento de capacidade instalada, este efeito é de longo prazo, e deve ser monitorado com cuidado, já que a curto prazo o efeito imediato é aumentar a demanda, pressionando os preços.


Como já vimos anteriormente, os 3,7% de crescimento econômico da década são menores do que todos esperávamos. Isto nos deixa com menos renda para distribuir entre assalariados, empresas e governos.


Assim como o seu crescimento, a repartição da renda também é afetada pela taxa de juros Selic. A cada ano, os detentores do M4, sejam eles dívida pública ou privada, se apropriam de parte importante da renda nacional na condição de rentistas. Aí também a taxa Selic é decisiva, pois condiciona a repartição da renda entre salários, lucros, aluguéis e juros de maneira importante.


Apesar das taxas de crescimento econômico frustrarem as expectativas brasileiras mais otimistas, o espaço criado no ambiente da estabilização para a recuperação das contas públicas e do reequilíbrio patrimonial do estado foram notáveis.


A universalização dos benefícios da previdência social, posta em marcha com a Constituição de 1988, foi bravamente suportada no ambiente da estabilidade.


O novo ambiente fez a saúde financeira dos governos ressurgir com um vigor tal que a expansão dos programas sociais, tipo bolsa família e outros, passou a ser, finalmente, factível.


A PARTICIPAÇÃO DOS SALÁRIOS NA RENDA.


Segundo o IBGE, a participação dos salários na renda nacional do país aumentou, mas menos do que a das empresas desde 1995 para cá.
 

1995
2000
2004
2008
2009
2010
% SALÁRIOS
42,6
40,5
39,3
41,8
43,4
43,0
% EMPRESAS
31,2
34,0
32,6
33,2
32,6
32,6
% IMPOSTOS
13,4
14,2
16,1
16,2
15,4
16,1
% TRAB AUT
12,8
11,4
9,7
8,8
8,6
8,3
 (João Hallak)


O aumento significativo ocorrido entre 1995 e 2010 ficou por conta dos impostos, que passaram de 13,4% para 16,1% do PIB. O segundo grande destaque a apontar foi a redução expressiva da renda dos trabalhadores autônomos, que passou de 12,8% em 1995 para 8,3% em 2010, indicando um intenso processo de formalização do emprego.


Os dados disponíveis para 2006 mostram que o % dos salários na renda é ainda baixo no Brasil, mas converge para os padrões dos países desenvolvidos.

6
% salários no PIB
BRASIL (*)
40,9
SUIÇA
62,1
EUA
56,8
REINO UNIDO
55,5
FRANÇA
51,8
JAPÃO
51,6
ALEMANHA
49,5
AUSTRÁLIA
47,9
COREIA DO SUL
45,4

(*) inclui FGTS e INSS


O BOLSA FAMÍLIA


O trabalho do economista Ricardo Paes de Barros, com base nos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios - PNAD, conseguiu detectar o impacto positivo dos programas conhecidos como Bolsa Família ou de renda mínima sobre a renda da população mais pobre.


De acordo com essas avaliações, a população situada abaixo linha da extrema miséria (definida pelo Banco Mundial como indivíduo com renda mensal inferior a R$ 70,00 por mês) tem-se reduzido sensivelmente.


A hipótese do trabalho aí conduzida é mostrar que a participação na renda dos 20% mais pobres da população brasileira tem sido aumentada, mais pelos efeitos positivos no mercado de trabalho, em decorrência da melhoria das condições de população beneficiada de aproveitar as oportunidades de emprego que surgem, do que pela transferência direta de recursos dos programas sociais.


Ou, segundo palavras do próprio pesquisador: “... ao que parece, ter o dinheiro para comprar um sapato, ou para pagar a passagem de ônibus, e poder comparecer em uma entrevista de emprego, acaba fazendo alguma diferença”.


A tabela a seguir é apresentada no trabalho mencionado:


2003
2009
Tx cresc % aa
Renda Per Capita (R$/mês)
62
100
8,4
%  adultos
55
58
0,9
Renda não derivada do trabalho (R$/mês)
25
49
12,3
Renda derivada do trabalho (R$/mês)
87
123
5,8
% RFderivada do trabalho
78
71
-
Renda Per Capita do trabalho (R$/mês)
-
81
-
Fonte: PNAD-IBGE




Apesar dos baixos níveis de crescimento econômico, uma evidência de como a estabilidade melhorou a renda dos trabalhadores e, ademais, tornou viáveis os programas sociais, aí incluída a universalização do INSS, o Bolsa Família e outros, é a redução abrupta do indicador da população na linha extrema pobreza de um nível de 17,3% em 1995 para 8,4% em 2009.


CONCLUSÕES:


As possibilidades postas pela estabilização na economia brasileira são extensas e ainda inexploradas em seu potencial;


- até aqui, 17 anos depois de 1994, ainda não conseguimos sequer aproveitar plenamente o potencial efetivo de crescimento econômico deste país;


- o grande vilão da história ainda é a taxa de juros, tanto para o crescimento como para a distribuição da renda. O respeito à restrição fiscal e o estimulo à poupança doméstica estão no caminho da sustentabilidade;


- na medida em que formos construindo os consensos em torno da gestão econômica, maiores serão as possibilidades de distribuir melhor a renda;


- os resultados obtidos com os programas sociais confirmam que dar o peixe pode ser funcional economicamente, desde que articulados com o uso de Parcerias público-privadas e de seus impactos sobre o mercado de trabalho.

 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Total de visualizações de página

Quem sou eu

Minha foto
Niterói, Rio de Janeiro, Brazil
Macroeconomista, Consultor e Professor da Fundação Getúlio Vargas - FGV e da FK Partners. Autor do livro Saia do Vermelho - Editora Qualitymark

Seguidores

Livros interessantes

  • Pai Rico Pai Pobre
  • Saia do Vermelho _ Editora Qualitymark. Autores Mario Juan Leal e Fernando Swami